Com gol de Fabiano, aos 54 minutos do segundo tempo, o Palmeiras conseguiu uma vitória épica contra o Peñarol. Um roteiro para exorcizar nossos fantasmas
Carlos Massari (@carlosmidiasep)
Colunista da Mídia Palmeirense
No primeiro jogo, muitas oportunidades perdidas e um empate fora de casa contra um rival fraco. No segundo, vitória no sufoco no Allianz Parque em um jogo que, como diria Galvão Bueno, foi teste para cardíaco. No terceiro, um adversário uruguaio ruim tecnicamente, mas raçudo e eficaz, abre o placar diante dentro do nosso estádio lotado e parece começar a anunciar uma catástrofe.
O mundo anda repetitivo. Esse roteiro serve tanto para a Libertadores 2016, como para a 2017.
Você pode me dizer que as semelhanças acabam por aí, mas eu vou discordar: existe mais uma. Na busca pela recuperação contra esse time uruguaio, a bola do jogo caiu para um lateral direito. Nos acréscimos do segundo tempo, com o Palmeiras perdendo para o Nacional por 2 a 1, Lucas pegou a sobra de um escanteio e mandou na trave. Poderia ter sido o gol que mudaria não só a história daquela competição, mas de toda a narrativa recente alviverde. E se Marcelo Oliveira não fosse demitido? E se Cuca não chegasse? Seríamos hoje o time mais temido das Américas?
Nos acréscimos do segundo tempo, com o Palmeiras empatando com o Peñarol em 2 a 2, Fabiano mandou uma cabeçada fatal para o fundo da rede adversária. Hoje, respiramos aliviados. Não sabemos as implicações desse plot twist a longo prazo, mas elas provavelmente serão positivas.
Fabiano é o exorcista dos traumas palmeirenses. Podemos contestar a sua qualidade técnica, mas não há como negar a sua estrela. Fez dois dos gols mais importantes dos últimos meses: o que decretou o título nacional de 2016 e o que nos dá a tranquilidade necessária para seguir o caminho vitorioso em 2017. Ele quebrou a escrita do fantasma de 2009 e encerrou qualquer dúvida sobre quem levantaria a taça de campeão brasileiro. Ele quebrou a escrita do fracasso continental do ano passado e encerrou qualquer dúvida sobre a nossa capacidade de ir longe nessa Libertadores.
Às vezes, fracassos são inevitáveis. Por muitos anos, parecia que o Palmeiras convivia intimamente com eles. Que a bola teimava em não entrar, que os craques caiam de rendimento, desapareciam ou nem sequer existiam, que ninguém poderia fazer a diferença. Foi mais de uma década de sofrimento. Mas, aos poucos, os heróis improváveis tem voltado a vestir verde e branco.
Fabiano é o nosso herói improvável da atualidade. Como Betinho foi em 2012, mas em proporções maiores. Porque ele não só nos dá um título inexplicável, como foi o daquela Copa do Brasil, mas ele muda a história dos fracassos. Os dois gritos mais agudos de gol que saíram das nossas gargantas recentemente foram cortesia desse lateral que chegou desacreditado do Cruzeiro. Que é reserva. Que ninguém tem muita alegria em ver dentro de campo. Mas que é muito abençoado.
O futebol é fascinante porque é imprevisível. E porque é radicalmente humano. Miguel Borja é um craque, já venceu uma Libertadores na carreira, sempre demonstra sua técnica. Mas por nervosismo, ansiedade ou simplesmente por um vodu bem feito, não consegue balançar as redes com a nossa camisa na Libertadores. O gol diminui de tamanho, a bola não vai na direção esperada. Nem um pênalti permitiu ao colombiano tirar o gosto da secura da boca.
Se para Borja o sentimento de negatividade e inconformismo predomina em relação à competição continental, com Fabiano é o contrário. Ele aparece apenas quando necessário. Como um vampiro à espreita, que aguarda sua vítima desavisada passar pelo beco escuro, ele fica quieto, nas sombras, aguardando o momento de marcar o gol mais fundamental que se possa imaginar.
Fabiano é o lateral direito reserva do Palmeiras. Não é um craque. Não vai ter uma carreira longa no futebol europeu ou chegar à seleção brasileira. Talvez nem passe muito tempo em clubes considerados grandes. Mas já marcou seu nome na nossa história. E sempre seremos muito gratos por isso – a ele, e ao futebol que sempre continua pregando essas peças.