Trinta e três anos de idade, uma carreira praticamente no fim. Sem ter tido grande destaque no futebol, Jaílson Marcelino dos Santos recebeu o chamado para a aventura
Carlos Massari (@carlosmidiasep)
Colunista da Mídia Palmeirense
Depois de rodar por Campinense, Ceará, Oeste, Guaratinguetá e outros, seu time de coração na infância o queria. A torcida, desconfiada, não entendia porque aquele desconhecido era convidado a trajar o uniforme verde e branco mais glorioso do mundo. Mas, na mitologia, há muitas perguntas que ficam sem explicação.
A única vez que Jaílson atingira o noticiário antes daquilo não tinha sido positiva: sofreu o único gol do lendário Seu Pedro, o dono do Perilima, já de 58 anos de idade. Nos gramados do interior, há muitos causos dignos de serem contados e muitas histórias escondidas. Ninguém sabe contá-las a não ser os envolvidos. Os holofotes chamavam o arqueiro e o tirariam desse mundo em direção à glória.
Foram quase dois anos marcando presença no elenco do Palmeiras. Sem grandes chances, atrás de um ídolo chamado Fernando Prass. Ninguém na torcida se lembrava que Jaílson existia. Um outro goleiro foi contratado para ser o reserva imediato do dono incontestável da camisa 1, relegando ainda mais a existência daquele que um dia havia chegado ao time de forma inexplicável.
A campanha do Palmeiras no Campeonato Brasileiro de 2016 era brilhante. Líder, jogando um futebol vistoso, dominando os adversários. A segurança no gol proporcionada por Fernando Prass também ajudava muito. Até que um dia, os infortúnios da vida derrubaram o ídolo. Em sua primeira oportunidade com a seleção brasileira, uma lesão grave impede seu retorno naquele ano. O desespero toma conta da sempre remediada torcida verde e branca. Tudo só piora quando aquele que deveria ser o reserva, Vágner, falha constantemente e custa pontos importantes.
Sem esperanças, Cuca olha para o elenco e vê o herói esquecido. Um goleiro já com trinta e cinco anos, sem destaque na carreira, encostado no Palmeiras desde sua contratação. “Jaílson, é com você”. O pantera negra assume o gol palmeirense e confere àquela meta uma proteção mais que divina. Ajuda o clube a levantar a taça que era esperada há mais de vinte anos sem conhecer nenhuma derrota quando esteve dentro de campo.
Como o herói humilde que é, Jaílson se recolhe novamente ao papel de coadjuvante. O ídolo Fernando Prass se recupera da contusão e é hora novamente de deixar os holofotes. Por seis meses, novamente o banco de reservas é seu lugar, observando a montanha russa de emoções que o time proporciona. O olhar das sombras de um mito esquecido. Seria muito bonita a história do arqueiro se tivesse terminado ali, com um título de campeão brasileiro e então o ostracismo novamente. Mas não era o que os deuses do futebol queriam.
Mesmo sendo muito qualificado, o ídolo Fernando Prass começa a falhar. Não consegue recuperar a forma de antigamente, permite que bolas defensáveis balancem as redes. Após a melhora não vir, é hora de olhar novamente para as sombras. Cuca vê no banco mais uma vez aquela figura de antes, que pacientemente espera o momento de retornar à ação. E mais uma vez, chama: “Jaílson, é com você”.
De forma mágica, as redes alviverdes se blindam. Jaílson faz belas defesas e coroa seu dia salvando uma penalidade máxima. Voa no canto, com ásas muito mais bem construídas que as de Ícaro, e garante um empate ao Palmeiras fora de casa. O time se sente protegido. E a torcida palmeirense, que não acreditava que um dia aquele mito se iniciaria, percebe que ele também não acabou.
É o amor pelo Palmeiras que vem desde criança. É o entendimento do tamanho dessa camisa. É uma mística que parte desde o interior da Paraíba, onde sofreu o gol de Seu Pedro, e desembarca em São Paulo com uma bagagem enorme. Jaílson é Jaílson porque é a representação de todo palmeirense comum vivendo seu sonho. Como se eu e você fôssemos jogados lá, de repente, com a um, a cinco, a nove ou a dez, e começassemos a sentir uma força estranha que nos leva a sermos mais forte do que jamais conseguiríamos imaginar.
O mito de Jaílson é o mito de toda uma torcida podendo sentir o que é pisar no gramado e ter super poderes para defender seu clube. Chorar, sentir que pode ser tão importante como foi São Marcos, Ademir da Guia, Luís Pereira ou Julinho. E ele não se acaba. Enquanto existir amor à camisa, será gigante.
Que me desculpe o grande Fernando Prass, a quem eu agradeço e respeito muito, mas o mito de Jaílson é o que mantem viva a chama do olimpo da bola. Seja um final feliz ou uma tragédia, que ele continue sendo contado.
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